O chamado “Local do crime”, conforme dispõe a doutrina processual
penal, é representado pelo cenário que identifica os vestígios da
existência de um crime a ser esclarecido. Convencionou-se determiná-lo,
ainda, conforme a literatura policial, como sendo o espaço físico onde
tenha ocorrido um fato que possa ser caracterizado como delito, e que,
portanto, exige a intervenção das autoridades policiais.
De fato, o “local do crime”, constitui-se como o mais robusto arcabouço
fático-probatório disponível à investigação, com forte potencial de
elucidação do delito. Desta forma foi preciso o legislador pátrio,
elencando as obrigações da autoridade policial quanto à preservação do
local do evento criminal nos arts. 6º e 169 do Código de Processo Penal.
A partir de conhecimentos técnicos específicos das perícias e também da
expertise policial, detalhes aparentemente irrelevantes ao leigo poderão
servir de subsídio à conclusão de materialidade e autoria de um crime.
Com o “local do crime” preservado a investigação poderá reconstruir e
compreender o evento de forma célere e precisa.
Os policiais militares ou civis, normalmente os primeiros profissionais a
terem contato com a cena do crime, possuem a obrigação legal e devem
ter conhecimento técnico para preservar e garantir a integridade do
local até a chegada dos peritos. Tanto assim, que a norma processual foi
expressa, determinando que a autoridade policial “deverá dirigir-se ao
local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das
coisas, até a chegada dos peritos criminais”. Não se trata, portanto,
de ato discricionário ou de prerrogativa da autoridade policial, mas de
uma obrigação, expressamente prevista em Lei.
Ressalte-se, ademais, que as ações iniciais de preservação do local
crime não devem se limitar àquelas tomadas pelas autoridades policiais,
também a população necessita compreender a importância em se preservar o
cenário do crime intacto, evitando contaminação ou perda de provas.
Muitas vezes, o próprio ímpeto em ajudar pode resultar na alteração de
elementos que compõem o fato a ser esclarecido.
Os prejuízos advindos da adulteração do “local do crime” são enormes e
irreparáveis, desde o comprometimento das investigações realizadas pela
polícia judiciária, passando pela contaminação do curso da instrução
criminal e culminando, muitas vezes, na absolvição de autores de crimes
graves, diante a ausência, fragilização ou destruição de provas
importantes no processo de responsabilização penal.
Estudos realizados em nível nacional apontam que nosso histórico de
preservação de “local do crime” é ainda insipiente. Somos pouco
eficientes na manutenção dessas importantes provas para o inquérito
policial e o processo criminal, razão pela qual entendemos como
fundamental, reforçar ações que fomentem a importância da preservação do
“local do crime”, principalmente, na formação policial inicial, no
investimento e valorização da polícia científica, bem como no
treinamento policial integrado e contínuo nas academias de polícia.
Importante ressaltar, ainda, que a Ouvidoria de Polícia de Minas Gerais
demonstra especial atenção às denúncias de situações que apontam para a
descaracterização de locais, fatos e provas, restando claro que, a não
preservação do “local do crime”, de forma propositada ou não por agentes
do Estado, deve ser objeto de sindicância rigorosa por parte das
corregedorias respectivas.
Mais do que isso, precisamos investir em ações preventivas e
pedagógicas. Neste sentido, vale ressaltar que o processo de Integração e
Gestão do Sistema de Defesa Social – pilar fundamental e exitoso da
política pública de segurança estabelecida a partir de 2003 - pode e
deve ser uma ferramenta de monitoramento e controle do compasso exigido
de eficiência e rigor entre o trabalho da polícia ostensiva e aquele
outro realizado pela polícia judiciária no “local do crime”, de forma
que, respeitadas as competências constitucionais de cada instituição,
ganhe a população, com polícias mais inteligentes, integradas e
eficientes.
(Jornal Estado de Minas – Caderno Opinião- 09/03/2013)
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